quarta-feira, outubro 17, 2007

Meia


(D)escrevi este lema de vida em Abril do presente ano e hoje deparei-me com ele outra vez. Porque continua actual para mim aqui fica:

Olá!

Um espaço branco é sempre um óptimo espaço para dizer olá a nós mesmos. Nos considerarmos a nós mesmos. Ofertarmo-nos apoio, poder, dar-mo-nos segurança, confiança, bem-estar. A vida muda rapidamente se nos tornamos catalizadores dela mesma. Se pelo contrário, refizermos o passado passo-a-passo a vida, que é sempre nova, viva, parecerá exactamente a mesma... Ando meio-irritada com os colegas, comigo, com a família que vejo e aquela que não vejo mas sinto em sonhos; ando meio-apaziguada com a escola, a casa, o lazer. Meia. Ando meio-desconfiada, meio-esperançosa. Meio. É isso que hoje me define: meia-dor, meio-prazer. Mas posso dizer que gosto finalmente da minha vida. Gosto. Não adoro nem detesto. Gosto. Ando meio-saudável, meio-vulnerável, feliz e aborrecida ao mesmo tempo e ciclicamente, mas com estados de espírito mais próximos uns dos outros, mais integrados.

Tenho notado que sempre que dou nome a um novo contínuo de realidades, por exemplo as classes (baixa e alta), fico como que obcecada em dar sentido à minha própria existência e tenho medo, muito medo, de não-existir ou de existir de forma demasiadamente esperada, esteriotipada. Desejo o meu poder próprio e tenho medo de como o possa usar. Contudo, “não usá-lo” (activamente) é já estar a exercer um determinado tipo de poder... Existe muita divisão na minha mente, teorias que não me ajudam a ser. Tento ser algo que me vá salvar da luta da sobrevivência, mas ela permanece, talvez mais valha reconhecê-la, conviver com ela, agir considerando-a em vez de a negar. Com o poder passa-se o mesmo, com o sexo o mesmo, com a traição, a maldade, a culpa, a inveja, o ciúme, e por fim, o ódio, assim como com a vontade de fazer algo novo para nós e para os nossos.

Há que considerar todas essas emoções, acções, pensamentos inerentes à vida de cada homem e atravessar as situações com eles, pois o mais desconcertante é assumi-los, é vivê-los e deixá-los ir, é sobreviver a nós mesmos e às nossas ligações afectivas. E quando essa experiência é feita discurso toda a gente o entende sem conseguir dar-lhe um sentido. Múltiplos existem e não podem ser separados. É isso que é desconcertante, não há como interpretar. A guerra, a luta pela sobrevivência hoje trava-se no mundo das identidades, dos auto-conceitos, da (des)valorização. Quem não aguenta cai, morre antes do tempo, torna-se escravo de outros que conseguem continuar a ser de alguma maneira. E esse que cai, e se torna escravo, pode continuar a viver assim, com algum poder, até morrer deveras, principalmente se acreditar que não pode, não deve ser diferente.

Se desconsiderarmos o poder que já temos, podemos descer na pirâmide, ou será, circumplexo, esfera do poder? Temos de saber qual é, o que devemos continuar a fazer para continuar a viver nesse mundo por ele criado e como progredir. É importante estar também conscientes dos enganos a que algumas formas de ver a nossa vida – com promessas de paraísos dificilmente alcançáveis – nos podem levar. O tempo de vida que tal pode levar. Não odiar demasiado nada (dinheiro, política, drogas, armas, prostituição, guerra, religião, família, sexo, sociedade, colegas/pares, outros específicos – homossexuais, ciganos, toxicodependentes, seropositivos...), mas perceber a utilidade de cada coisa, cada ser, agindo como construtores fiéis do nosso Universo Pessoal. Gostar de forma simples, prezando mais o momento como verdadeiro criador do futuro que queremos. E quando não gostamos – ficar a sabê-lo sem explicações, sem interrogações, sem exclamações. Ficar a saber um pouco mais de nós, aproximando-nos do que nos parece bem. Encontrar a beleza do desenvolvimento sem nos fixarmos em nenhuma etapa específica. Criar discursos verbais e não-verbais que brotam dessa beleza que inclui tudo sem exagerar.

É assim que me sinto. Meio-boa, meio-má e é assim que me quero sentir pois sou ambas. E em breve poderei verbalizar só Meia.

Meio do Mundo de onde tudo o que vivi, vivo e viverei brota.

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